domingo, 11 de janeiro de 2009

A Sombra

Às vezes as forças fugiam-lhe, desvanecendo-se misteriosamente. Multiplicavam-se então as pequenas necessidades, coisas inúteis cujo verdadeiro propósito era a distracção. «Foges!», sentia ele no seu coração. E quanto mais o sentia, mais imperativa se tornava a fuga. Os pensamentos tornavam-se mais cinzentos, e tudo parecia oco, vazio. Havia uma perturbação inexplicável, injustificável. Um travo amargo de quase. «Poupa-te!», recomendava-lhe essa voz que o endurecia de cepticismo. Perdia-se então em esquemas, deduções, charadas. Se...! E depois, surgiam os afectos miragem, que prometiam preencher mas que apenas esvaziavam.

Num desses dias, enquanto passeava sozinho pelo cais à procura não sabia bem de quê, reparou que alguém o acompanhava. Era a sua sombra. Estava definhada, encolhida sobre si própria. Lembrou-se então de alguns momentos em que a sua sombra fora muito maior do que o seu corpo. Recordava, em particular, as vezes em que a sombra o reflectira em quatro direcções, sem sequer se conseguir ver o seu limite. E apercebeu-se de que a sombra era apenas uma imagem de si próprio, projectada pela luz que o iluminava.

Começou, nesse dia, a pensar que tipo de luzes fariam a sua sombra ser gigante.

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